quinta-feira, 22 de novembro de 2018

IRON MAIDEN - The Number of the Beast


Ano: 1982
Tipo: Full Length
Selo: EMI Odeon
Nacional


Tracklist:

1. Invaders
2. Children of the Damned
3. The Prisoner
4. 22 Acacia Avenue
5. The Number of the Beast
6. Run to the Hills
7. Gangland
8. Hallowed Be Thy Name


Banda:


Bruce Dickinson - Vocais
Adrian Smith - Guitarras, backing vocals
Dave Murray - Guitarras
Steve Harris - Baixo
Clive Burr - Bateria


Ficha Técnica:

Martin “Farmer” Birch - Produção, engenharia, mixagem
Derek Riggs - Artwork


Contatos:

Assessoria:
E-mail:

Texto: “Metal Mark” Garcia


Existem tradições no Metal que são difíceis de precisar quando as mesmas surgiram. Uma delas é a mística que envolve o terceiro disco do uma banda qualquer: ele tem que ser o divisor de águas na carreira do grupo, e se ele não for um algo de alto nível e que chegue ao sucesso, a banda ficará eternamente nos níveis inferiores, nunca será do “time principal”. O terceiro disco é considerado “a nega”, ou seja, não há como escapar. Talvez o pai dessa mística seja “The Number of the Beast”, terceiro disco do IRON MAIDEN, a banda de maior sucesso comercial do Metal em todos os tempos. É o disco legendário deles, aquele cujo nome vem à mente de qualquer fã quando a banda é citada.


Mas o que há por trás dele, afinal de contas?

Antes de tudo, voltemos no tempo: ainda em 1981, devido ao abuso no consumo de drogas, o vocalista Paul Di’Anno havia deixado a banda. Em setembro do mesmo ano, o ex-vocalista do SAMSON, Bruce Dickinson (na época, chamado Bruce Bruce) faz sua audição e entra para o quinteto, mas obrigações legais com seu ex-grupo não o permitiram participar do processo de composição (onde Adrian Smith e Clive Burr aparecem). Além do mais, o estilo de compor de Steve Harris evolui e começa a transitar para o que seria conhecido nos discos posteriores, ganhando maior ênfase técnica, se afastando da energia crua do Punk Rock que a NWOBHM carregava, mas mantendo a energia e peso de antes. Ao mesmo tempo, o quinteto não tinha muito material antigo de sobra a ser aproveitado, logo, o disco é todo fresco, novo.

O que há nele de diferente?

Ao mesmo tempo em que a voz de Bruce trouxe maior diversificação ao trabalho da banda, o entrosamento dos outros membros (vindo de shows e turnês incessantes) também fazia diferença. Mas algo em “The Number of the Beast” é diferente, tanto em relação aos discos anteriores como aos posteriores, algo que poderíamos dizer que seria um marco. Talvez a causa dessa característica seja justamente por ele ser um disco de transição: a banda está indo do passado com o toque de crueza (embora já houvessem dado sinais que fariam algo mais elaborado a partir de “Killers”) para um futuro mais trabalhado e dinâmico (o que se concretizará em “Piece of Mind” e “Powerslave”), ou seja, é um disco em que a banda está entre seu passado e seu futuro, pegando o melhor de ambos.

Gravado entre janeiro e fevereiro de 1982 no Battery Studios, em Londres, a produção, como ocorreu com “Killers”, é assinada pelo veterano Martin Birch, conhecido por conta de seus trabalhos com FLEETWOOD MAC, DEEP PURPLE, RAINBOW, BLACK SABBATH, WHITESNAKE, BLUE ÖYSTER CULT, WISHBONE ASH, entre outros. Basicamente, a sonoridade é a mesma de “Killers”, tendo a crueza dos sistemas analógicos, instrumentos musicais e efeitos mais antigos (gravar uma bateria microfonada não é uma tarefa das mais simples), mas mantendo a limpeza e bom gosto de sempre. Óbvio que para os padrões modernos pode soar abafado e cru, mas era algo “top” para aqueles tempos.


Na arte, o trabalho de Derek Riggs é belo e chamativo (embora a montagem com a banda na contracapa seja algo tosco). Óbvio que o choque causado pelo desenho causou polêmicas em excesso, já que o grupo foi perseguido por grupos de fanáticos, sob a acusação de satanismo. Uma pena que poucos viram as entrevistas, por anos a fio, explicando que a letra da faixa-título vem de um pesadelo que Steve Harris (compositor da canção) teve depois de ver “Damien: Omen II” (conhecido por aqui como “A Profecia II”), embora ela também sofra a influência do poema “Tam o’ Shanter”, de Robert Burns.

Musicalmente falando, “The Number of the Beast” é um disco que pertence a dois mundos ao mesmo tempo: o passado do IRON MAIDEN e o futuro que estava à mão. A energia e frescor dele não se dissiparam em nada em 32 anos desde seu lançamento. Óbvio, pois as melodias bem compostas, refrães marcantes, a sabedoria de como conduzir os ritmos, tudo nesse disco tem um brilho enorme. Além disso, a banda estava com sangue nos olhos: Bruce em uma forma esplendorosa, Dave e Adrian entrosados e fazendo riffs e solos memoráveis, o baixo de Steve mais parecendo um tanque de guerra com peso e brilho (e não é à toa um dos 5 melhores baixista do Metal de todos os tempos), além do já finado Clive dar um show de peso e “groove” na bateria. Não tinha como dar errado.

E não deu!


“The Number of the Beast” é um dos grandes clássicos do Metal de todos os tempos, e o disco definitivo do IRON MAIDEN. E as canções mostram o porquê desta afirmação tão categórica.

O lado A abre com a torrente de energia de “Invaders”, uma faixa que tem clara influência do Hard ‘n’ Heavy da NWOBHM, que se encaixaria perfeitamente em “Iron Maiden” em termos de consensualidade (e que trabalho das guitarras e baixo). Em seguida, um dos grandes clássicos do grupo, “Children of the Damned”, que é tocada regularmente nos shows até hoje, uma semi-balada pesada climática onde os vocais já mostram sua potencialidade, e faz uma ligação interessante entre “Remember Tomorrow” e “Revelations”. Já com algo que apontava para o futuro vem “The Prisioner”, cuja letra é baseada em um seriado inglês de mesmo nome, e que tem um refrão grudento e as guitarras dão uma aula em termos de riffs e solos. Se querem entender como o quinteto é uma influência seminal do Metal norte-americano, basta uma ouvida em “22 Acacia Avenue” (que faz parte da estória contada em “Charlotte the Harlot”, e cuja música pertencia a finada banda anterior de Adrian, URCHIN). O lado A, mesmo com seus méritos e pessoalidades, ainda é consensual com “Iron Maiden” e “Killers” em termos estilísticos.

No lado B, o caldo engrossa!

A narrativa do ator inglês Barry Clayton para as citações 12, 12 e 13, 18 do Livro do Apocalipse (que para quem não sabe, o termo vem do grego “apokalypsis” e significa “revelação”) introduzem a clássica “The Number of the Beast”, que começa sinistra e logo surge um grito agudo e a canção explode em peso, mostrando um trabalho ótimo de baixo e bateria; ela foi o segundo Single do álbum (lançado em 26 de Abril 1982) e quem nunca gritou “six, six, six, the Number of the Beast” na vida não sabe o que é Heavy Metal. Em seguida, talvez a mais icônica canção do álbum, e justamente o primeiro Single (lançado em 12 de Fevereiro 1982, apenas 10 dias antes do disco): “Run to the Hills”, com guitarras em tom quase zombeteiro no início, antes de virar uma avalanche de energia intensa, outro refrão que não se esquece nunca, e o baixo trovejando (e cuja letra trata dos conflitos entre os povos indígenas da América e dos colonizadores europeus sob a perspectiva de cada um dos lados), e também concede pistas do que a banda seria nos anos vindouros. Óbvio que uma enorme parte dos fãs concorda (inclusive o próprio Steve Harris assume isso) que a boa “Gangland” é uma canção que não é tão boa como as anteriores, logo, puxou o nível do disco para baixo (é uma boa canção, mas só isso, embora a bateria esteja bem nela). Fechando o disco, a clássica “Hallowed Be Thy Name”, que começa lentinha e climática, para depois ganhar mais energia e peso, uma faixa épica e que terá “crias” no futuro, uma aula de interpretação dos vocais e um ritmo empolgante, encerrando este clássico com chave de ouro.


Ah, sim: é preciso lembrar que “Total Eclipse” é uma sobra de estúdio que foi um “lado B” da banda, justamente para o Single de “Run to the Hills”. E é justamente sobre ele que Steve manifestou o descontentamento com a escolha da banda de “Gangland” estar no álbum, já que ela talvez se encaixasse melhor no contexto musical do álbum, conforme consta na biografia “Iron Maiden: Run to the Hills”, de 2004 (escrita por Mick Wall). Uma sorte que ela é incluída nas edições em CD de “The Number of the Beast” desde a série remasterizada de 1998.

Algumas curiosidades:

1. Bruce alega que a banda pediu ao ator Vincent Price para fazer introdução de “The Number of the Beast”, mas deixaram para lá por não poderem na época arcar com valor pedido £25.000.

2. Quando estavam em turnê pela Alemanha em 1982, congelando em uma van, eles receberam uma ligação de Rod Smallwood lhes dizendo para continuar, pois o disco estava vendendo bem.

3. Os protestos de fanáticos religiosos contra a banda por causa da letra de “The Number of the Beast” é uma mostra do chamado efeito Streisand, ou seja, quanto mais se tenta abafar, calar, censurar ou outro ato similar, mais divulga aquilo.

4. Curiosamente, ele parece ser o disco que mais “desencaminhou” filhos de boas famílias, já que o número de versões para as músicas desse disco é algo absurdo. Não dá para contabilizar.

5. Assim como seus antecessores, “The Number of the Beast” mostra mudanças de formação: Bruce no lugar de Paul nos vocais. E ele seria o último disco de Clive na banda, que seria substituído pelo ex-baterista do grupo francês TRUST (aquele mesmo, que compôs a música “Antisocial”, popularizada pelo ANTHRAX), Nicko McBrain. Interessante saber que o posto de Nicko seria preenchido por ninguém menos que Clive! E sabe-se que o IRON MAIDEN havia tido o TRUST como “opening act” da parte francesa da Beast on the Road Tour”.

No mais, “The Number of the Beast” justifica a tradição de “o terceiro é à vera”, ou seja, ou vira celebridade ou vira “Cult”. E ele é um disco tão importante para a história do Metal que não só ajudou a promover o gênero, mas abriu as portas de muitos países para a banda, inclusive o Brasil






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